O espiritualista na sociedade…

  • Encontrar o equilíbrio entre o espiritual e o material
  • Distinguir claramente o fim e os meios
  • Trabalho físico e trabalho espiritual
  • Assumir as tarefas quotidianas
  • A escolha de constituir família
  • Não querer impor as suas convicções
  • A vida de casal: não fugir aos problemas
  • Aceitar o destino sem se submeter a ele passivamente
  • O campo das nossas responsabilidades
  • A atitude correta
  • Só se influencia os outros pelo exemplo
  • Receber e dar
  • Uma justiça superior
  • Como pode alguém ajudar o seu país
  • Ninguém se salva sozinho

Os temas apresentados nestes extratos são desenvolvidos nas seguintes obras da Coleção Izvor:

202 – O homem à conquista do seu destino; 211 – A liberdade, vitória do espírito; 214 – A galvanoplastia espiritual; 224 – Poderes do pensamento; 227 – Regras de ouro para a vida quotidiana; 231 – Sementes de felicidade

Encontrar o equilíbrio entre o espiritual e o material...

 Muitas pessoas dizem: «Primeiro, vou resolver todos os meus problemas materiais, e depois estarei livre para pensar na vida espiritual…» Mas, na realidade, os anos passaram e ei­‑las já velhas, gastas, sem terem conseguido consagrar um minuto à vida espiritual! E porquê? Porque fizeram um raciocínio errado.

Para viver a vida espiritual não se deve esperar até se ter conseguido resolver todas as questões, porque nunca uma coisa está definitivamente resolvida; há sempre algo que falta algures. É exatamente como se tentásseis dar de novo a forma redonda a uma bola de borracha furada: quando conseguis eliminar a concavidade de um lado, ela forma-se do outro.

Vós tendes um trabalho, mas pouco depois perdeis o lugar e ficais no desemprego… Casais mas, passado algum tempo, nada vai bem e divorciais-vos… Tendes uma casa, mas acontece qualquer coisa que vos obriga a mudar para outra… E os filhos… Que preocupações com os filhos: a sua saúde, a sua educação, o seu futuro! E depois dos filhos são os netos… Digo-vos que é interminável. Não espereis, pois, que as vossas questões materiais estejam resolvidas para depois viverdes a vida espiritual. Tanto mais que – também deveis saber isto! – é graças à vida espiritual que encontrareis as melhores soluções para todos os problemas que diariamente vos são colocados, porque sereis mais fortes, mais pacientes, mais sábios, mais prudentes.

Mas, evidentemente, é preciso saber respeitar os limites. Se me disserdes: «Bem, agora compreendi; vou organizar a minha vida de modo a não ter de despender mais tempo e mais energias com preocupações materiais, profissionais ou familiares», responder-vos-ei que também não deveis exagerar, porque viveis no mundo e não podeis proceder como se ele não existisse. Se vos comportardes como um insociável e um parasita, vegetareis e sereis um peso para os outros. Pois bem, isso não é recomendável. É preciso saber ajustar as atividades do mundo com as da vida espiritual. É um equilíbrio que todo o ser humano que quer evoluir deve encontrar: saber viver no mundo, relacionar-se com ele, mas dando o primeiro lugar ao essencial – a alma e o espírito.

É pela sua maneira de ajustar estes dois aspetos – o material e o espiritual – que cada um revela o seu grau de evolução, e nada é mais difícil. Uns são tentados a afundar-se na vida material, esquecendo a vida do espírito, e outros a não se ocupar senão da vida do espírito, descurando a vida material. Mas existe uma terceira solução, e é essa que cada um deve encontrar para si, porque cada um é um caso particular. No fundo, evidentemente, todos os seres humanos possuem a mesma natureza, têm as mesmas necessidades, mas o seu grau de evolução não é o mesmo, o seu temperamento não é o mesmo, a sua vocação nesta existência não é a mesma, e cada um deve encontrar individualmente o seu equilíbrio, sem querer imitar o vizinho. Quem se sente impelido a fundar família não pode resolver a questão como quem prefere ficar solteiro. O que tem necessidade de muita atividade física não pode levar a mesma vida que o que tem um temperamento meditativo, contemplativo. O essencial é que cada um seja capaz de se analisar bem, a fim de conhecer as suas tendências profundas; depois, conhecendo-as, deverá esforçar-se por equilibrar, na sua vida, o espiritual com o material.

Distinguir claramente o fim e os meios...

O verdadeiro espiritualista é aquele que compreendeu como o espírito trabalha sobre a matéria: ele serve-se de tudo o que a natureza pôs à sua disposição, mas, em vez de o utilizar para satisfação dos seus apetites egoístas, põe-no ao serviço de um ideal superior, para si próprio e para os outros. Infelizmente, ainda não é para este fim que os humanos trabalham; eles chamam tudo a si, procuram acima de tudo o seu interesse, o seu proveito, o seu prazer. Reparai na maneira como eles exploram os animais, as árvores, as montanhas, os rios, o mar… E, se algum dia tivessem meios técnicos suficientes para isso, veríeis o que eles fariam do sol, da lua ou dos outros planetas! Para satisfazerem os seus apetites inferiores, estão prontos a sacrificar tudo aquilo de que podem aproveitar-se. Nem hesitariam em utilizar as revelações mais sagradas da Ciência Iniciática; iriam mesmo bater à porta do Senhor para que Ele os ajudasse nas suas negociatas e nas suas loucuras.

Ora bem, é preciso compreender que ser espiritualista não consiste em orar, meditar e interessar-se pelas ciências esotéricas, mas em ver claramente quais as motivações e os interesses que vos impelem para essas atividades. O essencial é o fim que procurais atingir! Se utilizardes a prece e o poder do pensamento, como tantos livros perigosos recomendam, para satisfazer as vossas cobiças (ter êxito nos negócios, obter o amor de alguém…), estareis a agir como o pior dos materialistas e, em alguns casos, até como um criminoso. O descrente, o ateu, que parte pedras para ajudar um desgraçado a construir a sua casa é um espiritualista mais autêntico do que vós!

Para se ser um verdadeiro espiritualista é preciso ter-se resolvido de uma vez por todas a questão dos fins e dos meios, porque é aí que se originam todas as confusões, todas as ilusões. O que são esses espiritualistas que mobilizam todas as faculdades psíquicas mais preciosas para atingirem os objetivos mais egoístas e terra a terra? E julgais que eles se aperceberam dessa situação? De modo nenhum! Eles nunca tiveram tempo para perguntar a si próprios: «Mas como é que eu estou a agir? O que é que eu procuro?» É preciso que alguém venha sacudi-los e perguntar-lhes: «Repara, meu caro: que objetivo é o teu? É o Inferno! E os teus meios? Pois bem, são o Senhor, os anjos, a ciência, a arte, a religião… Sim, todas essas coisas santas, para acabares por cair no Inferno.»

Portanto, agora tudo está claro: o que deve contar para vós é o objetivo, a direção, a razão pela qual fazeis as coisas; seja comer, respirar, passear, trabalhar, amar, estudar… fazei-o com o objetivo de consagrar todas as vantagens daí resultantes ao bem do mundo inteiro.

Vejamos o exemplo dos estudos. Há cada vez mais pessoas que estudam, e durante o máximo de tempo possível, por terem bastantes meios à sua disposição. Mas ao serviço de quem e de quê colocam elas esses conhecimentos? Quantas há que tomam consciência das suas responsabilidades e dizem para si próprias: «Ora bem; com todos estes conhecimentos, tenho mesmo de fazer o bem, tenho de ajudar os outros, não sou só eu que devo beneficiar»? A maioria servir-se-á desses conhecimentos para se pavonear, para enriquecer, para despojar os outros. Muito poucas pensarão que podem servir-se dos seus conhecimentos para se tornarem benfeitoras da humanidade.

Compete a vós, pois, decidir. Quereis tornar-vos materialistas que se servem dos recursos do espírito para tratar dos seus assuntos ou verdadeiros espiritualistas desejosos de pôr as suas qualidades, faculdades e forças, tudo o que possuem, ao serviço do espírito?

Trabalho físico e trabalho espiritual...

 Para imensas pessoas, o trabalho físico é incompatível com o trabalho espiritual. Ora bem, elas enganam-se, porque qualquer atividade física pode ser espiritualizada se se souber introduzir nela um elemento divino e, em contrapartida, uma atividade espiritual passa a ser extremamente prosaica se não visar um ideal superior. Todos os que tomam a vida espiritual como pretexto para abandonarem o trabalho no plano físico não são espiritualistas, na realidade, mas preguiçosos. Muito poucos seres são capazes de manter um verdadeiro trabalho espiritual durante várias horas. Os outros deixam-se levar apenas por divagações que os enfraquecem, que os transtornam; muitas vezes, fariam melhor se fossem lavar roupa, cozinhar ou tratar do jardim. Ainda há muitos mal-entendidos sobre esta questão. A espiritualidade não consiste em recusar a atividade física, mas em saber utilizá-la para se elevar, se harmonizar, se ligar a Deus.

Tenho ouvido frequentemente pessoas que se intitulam espiritualistas dizerem que, ao trabalharem no plano físico, perdiam a sua luz! Meu Deus! Mas o que compreenderam elas da natureza da luz? Os homens primitivos sabiam mais do que elas a este respeito. Quando queriam acender o fogo, por exemplo, eles pegavam em dois pedaços de madeira e esfregavam-nos um no outro: este atrito produzia calor e, passados uns momentos, aparecia uma chama, a luz. A luz é, pois, o resultado do movimento e do calor. Sim, aquele que faz trabalho no plano físico pondo nele toda a sua convicção e consciência sente nascer em si o amor, “o calor”, por esse trabalho; o seu coração rejubila e jorra uma luz no seu espírito.

Deveis, pois, compreender que o trabalho no plano físico é indispensável para a evolução de cada um. Mesmo que ninguém vo-lo peça, vós próprios deveis obrigar-vos a ele; isso refletir-se-á de uma maneira benéfica em primeiro lugar na vossa saúde, mas também na vossa compreensão das coisas. E em vossa casa, sempre que tiverdes ocasião de limpar, de arrumar, de lavar, de coser, de fazer pequenos trabalhos, fazei-o, nunca vos mostreis negligentes. Dizei a vós próprios que não é deixando o trabalho material para os outros que dareis mostras de que sois mais evoluídos.

Precisais de vos desembaraçar de uma vez por todas desses conceitos errados. Se imaginais que trabalhando fisicamente perdereis a vossa luz, muito bem, é preferível perdê-la, porque essa não é a verdadeira luz! A verdadeira luz ninguém a perde trabalhando, pelo contrário. Se trabalhardes, ela não vos abandonará; é graças ao trabalho que compreendereis melhor as coisas, que fareis descobertas, não é deixando-o para outros, alegando que estais em conversa com os anjos ou com o Senhor.

A verdadeira luz está ligada ao verdadeiro amor, o verdadeiro amor está ligado à verdadeira vontade e a vontade treina-se pelo trabalho no plano físico. 

Assumir as tarefas quotidianas...

  A vida quotidiana não é senão uma sucessão de tarefas que é necessário realizar; todos os dias é preciso ir trabalhar, todos os dias há que pensar na família, na mulher ou no marido, nos filhos, nos pais, etc. Por toda a parte há problemas a resolver, novas situações a enfrentar, e muitas vezes é difícil. Mas não se deve fugir a esses esforços. Sejam quais forem as tarefas de que o destino vos encarregou, deveis incumbir-vos delas o melhor possível. Se as descurais com o pretexto de que são fastidiosas ou indignas de vós, parais na vossa evolução e, de qualquer maneira, sereis obrigados a voltar para as assumir até ao fim. Então, constatareis como é difícil ter de retomar uma tarefa que se imaginava ter completado.

Quem julga que pode escapar às suas obrigações para levar uma vida mais fácil, mais agradável, não conhece as severas leis que regem o destino. Se estamos na terra, a sofrer e a debater-nos no meio de tantas dificuldades, é precisamente porque devemos recomeçar a nossa tarefa. Enviaram-nos à terra para repararmos certas coisas, para nos mostrarem que não sabemos trabalhar e precisamos de aprender a fazê-lo. Se não aceitarmos isso, seremos enviados de novo e as nossas falhas tornar-se-ão cada vez mais difíceis de corrigir.

Dir-me-eis: «Mas há momentos em que a situação fica insustentável, não se consegue suportar mais, fica-se esmagado.» Sim, eu compreendo. Então, ide tomar ar por uns momentos e depois voltai para enfrentar a situação.

A escolha de constituir família...

  Por egoísmo ou por preguiça, algumas pessoas escolhem viver sozinhas e sem filhos. Querem ser livres para aproveitar a vida como lhes aprouver; não têm vontade de constituir família porque isso traz demasiadas preocupações, demasiado trabalho, demasiados sacrifícios. Elas não sabem que não se tem o direito de recusar o casamento e os filhos por uma tal razão. Não terão as preocupações dos pais e das mães de família, é verdade, mas o seu egoísmo engendrará para elas toda a espécie de tormentos. Isso não significa que seja absolutamente necessário uma pessoa casar e ter filhos. Aqueles que querem ficar sós para serem livres de se consagrar a tarefas mais vastas, mais coletivas, estão justificados. Mas, os outros, mais vale que se casem, que tenham filhos, que assumam responsabilidades, que façam ao menos alguma coisa por alguém que não eles, e assim alargarão o seu campo de consciência.

Não querer impor as suas convicções...

  Por vezes, numa família, alguns membros manifestam aspirações espirituais e outros não os compreendem e tentam opor-se a eles. Não é uma atitude inteligente. Não se pode impedir uma alma de caminhar para a luz, porque a alma é filha de Deus, ninguém tem direitos sobre ela. Por isso, em vez de se ficar irritado, é preferível aceitar tendo presente que, se um membro da família se enriquece interiormente, toda a família beneficiará também dessa riqueza.

Agora, para ser justo, direi que é sobretudo àqueles que desejam abraçar a espiritualidade que compete mostrarem-se, o mais possível, sensatos e conciliadores. Eles não devem, com o pretexto de se dedicarem à vida espiritual, descurar as suas obrigações familiares e pôr-se a fazer sermões a torto e a direito. Pelo contrário, para cativarem e convencerem os outros da justeza e da sinceridade das suas aspirações, eles devem usar a inteligência e o coração para fazerem reinar a harmonia nas suas famílias e, sobretudo, não se deixarem levar pelo fanatismo, permanecendo abertos e compreensivos; é a melhor maneira de mostrarem que encontraram a verdade. Quem tem tendência para proclamar a todo o momento que encontrou a verdade prova, pelo contrário, que não a encontrou, e não faz mais do que tornar-se insuportável e ridículo. É pela ternura, pela gentileza, pela paciência, que deveis tentar influenciar para a via do bem os que vos são chegados.

A vida de casal: não fugir aos problemas...

É extremamente raro existir um entendimento perfeito num casal. E é normal, porque cada ser humano é um mundo tão singular e complexo que é impossível não haver problemas no ajustamento das necessidades, das mentalidades, dos humores. Mas, em vez de se querer a separação logo que surgem as primeiras dificuldades, é preferível fazer um esforço para resolver a situação. Uma relação, um casamento, é como que um problema que o Céu vos deu para resolverdes. Se encontrastes uma dada mulher ou um dado homem e decidistes ligar-vos a ele, isso não foi por acaso, há uma razão. Devido ao que vivestes nas vossas incarnações anteriores, deveis agora compreender uma determinada verdade, reparar um determinado erro, e, se vos recusardes, se fugirdes, o problema continuará por resolver e ireis encontrá-lo de novo, sob uma forma ou outra. Seja com essa pessoa ou com outra, encontrá-lo-eis de novo. É algo que eu devo dizer-vos. Compreendei que tendes interesse em agir com paciência e generosidade, a fim de não contrairdes novas dívidas e, tanto quanto possível, conseguirdes saldar as antigas.

Vale a pena aceitardes esta filosofia a fim de vos libertardes. Perguntai-vos: «Por que é que, entre mais de dois mil milhões de mulheres (ou de homens) no mundo, me foi calhar precisamente esta (ou este)? Havia tantas outras (ou outros)!» Foi esse o ser que encontrastes porque é precisamente através dele que fareis um trabalho interior para poderdes desenvolver certas qualidades e virtudes. Infelizmente, a maioria das pessoas não raciocinam assim, porque não foram instruídas acerca da reincarnação, da lei das causas e das consequências, do carma.

Na realidade, não é absolutamente interdito deixar um marido ou uma mulher, mas não antes de se ter resolvido o primeiro problema colocado, senão voltareis a encontrar esse problema com a parceira ou o parceiro seguinte. É difícil, claro, mas o que parece difícil à primeira vista acaba por revelar-se o mais fácil, e inversamente. Se escolherdes o caminho mais difícil, recebereis interiormente a ajuda que vos permitirá levar até ao fim os vossos esforços.

 

Aceitar o destino sem se submeter a ele passivamente...

  Todas as provações que nos chegam nesta vida são consequência de erros que cometemos, de transgressões a leis em que incorremos nas nossas incarnações precedentes. Agora temos lições a aprender, erros a reparar, e não podemos escapar-lhes; de uma maneira ou de outra, é necessário “pagar”. Sim, pagar para aprender e pagar para reparar. Este pagamento faz parte das leis do carma, há que aceitá-lo. Aliás, mesmo que ele não seja aceite, nada muda. Não se pode escapar à Justiça Divina nem se pode contorná-la. Por isso é inútil consultarmos astrólogos ou clarividentes para eles nos prevenirem de perdas e acidentes a que estamos expostos e para que, assim prevenidos, possamos defender-nos. O que quer que façamos, nada evitaremos: não se escapa ao destino por meio de astúcias, e uma tal atitude é indigna de um verdadeiro espiritualista.

Deveis compreender de uma vez por todas como funciona a Justiça Divina e sentir confiança nela. É como se todos os erros que cometestes fossem pesar no prato de uma balança e todas as vossas boas ações no outro prato. Então, quando chega o momento de pagardes pelas transgressões, tudo o que tiverdes feito para o bem intervém, para que o pagamento seja menos pesado. Esta lei é válida em todos os domínios; os esforços que fazeis para vos tornardes mais fortes e mais puros permitir-vos-ão sempre enfrentar as provações em melhores condições.

Que fique, pois, bem claro: deveis, por um lado, saber que não se escapa à Justiça Divina e, por outro lado, estar sempre conscientes de que tudo o que fazeis de bom se transforma em energias, em forças, para vos fazer triunfar nas provações. Não é por se conhecer as leis do carma que se deve tomá-las como pretexto para nada fazer e submeter-se passivamente ao seu próprio destino. Não se deve ser assim passivo, pelo contrário, deve-se duplicar as doses de luz e de amor, em relação a si próprio, mas também em relação aos outros. Perante o sofrimento dos outros, também não se deve ficar sem reagir, dizendo: «Paciência! O destino deles é sofrer, porque o mereceram.»

Infelizmente, eu constatei isso: alguns pretensos espiritualistas, em vez de pensarem em todos os que sofrem e decidirem fazer algo para os ajudar, contentam-se em dizer: «Oh! É o seu carma.» E não fazem nada. Seria preferível as pessoas nunca terem ouvido de carma se isso lhes serve de justificação para ficarem a chafurdar no seu egoísmo! Por isso eu acho que, apesar de tudo, é uma grande superioridade da parte dos ocidentais não aceitarem as desgraças dos outros sem fazerem algo. Isso é visível: quando há fomes, epidemias, inundações, tremores de terra, imediatamente eles organizam socorros, o que é magnífico!

Na realidade, claro, o que é preferível é que todos conheçam as leis do destino e compreendam por que acontecem certas desgraças, a eles e aos outros, mas sem deixarem de querer ajudá-los. Alguém perguntará: «Mas porquê ajudá-los, se eles têm o que merecem?» Em primeiro lugar, porque os esforços que fazeis para ajudar alguém nunca são inúteis: em determinadas circunstâncias, ao ver a vossa sinceridade, o Céu pode deixar-se comover; mas também por vós mesmos, para progredirdes, porque ajudando outros desenvolveis algo em vós.

Não é fácil ser realmente útil aos outros, é verdade, mas isso não tem importância. Continuai a querer ajudar os humanos seja em que circunstâncias for, porque, em última análise, sois vós que saís reforçados, que vos tornais mais inteligentes, mais sábios, mais livres.

  

O campo das nossas responsabilidades...

  Em todos os domínios – político, social, científico, económico, religioso, moral – se ouve as pessoas falarem de responsabilidade. Presidentes, ministros, generais, diretores, pais, professores, etc., todos sabem que são responsáveis. Uma quantidade de seres humanos e de acontecimentos dependem do seu comportamento, das suas decisões.

Sim, mas a noção de responsabilidade vai muito mais longe, porque todas as criaturas no mundo estão ligadas entre si e se influenciam mutuamente. A despeito das aparências, a separação não existe, é uma ilusão, nada está separado. E é assim que, não só pelos nossos atos mas também pelos nossos pensamentos e sentimentos, cada um de nós tem influência nos outros seres do mundo inteiro. Precisamos de saber isto para termos a verdadeira dimensão das nossas responsabilidades.

Vale a pena refletir sobre este assunto. Todos vós tendes imensas responsabilidades que podeis utilizar como ocasiões para vos desenvolverdes e vos tornardes mais conscientes, mais lúcidos, mais senhores de vós. Como é magnífico saberdes, com plena certeza, que, pela vossa vida pura, nobre e luminosa, podeis arrastar todas as criaturas para a via do bem! Ainda que vos pareça que o que fazeis não produz qualquer efeito, na realidade há sempre, algures, algo de bom que desperta, que recebe um impulso. E, se vos desleixardes, influenciareis também os outros, criareis condições favoráveis para a sua queda.

Vou dar-vos um exemplo: estivestes a meditar durante muito tempo e profundamente, enviando luz e amor ao mundo inteiro, e depois saís para caminhar um pouco pelas ruas. Quando voltais a casa, não tendes a impressão de ter feito o que quer que fosse… Pois bem, estais enganados. Se fôsseis clarividentes, veríeis bem o que a vossa presença pôde fazer, sem que o soubésseis, às pessoas com quem vos cruzastes. Algumas, que tinham projetos maléficos, abandonaram esses projetos; outras, que estavam perturbadas, desesperadas, encontraram um pouco de serenidade e de ânimo. Tudo depende da sinceridade das vossas aspirações.

Os vossos estados interiores não dizem respeito unicamente a vós; eles também influenciam quem vos rodeia, e vós sois responsáveis… Se não acreditardes em mim, tanto pior para vós, um dia verificá-lo-eis! Quando chegardes ao outro lado e vos disserem: «Olha para estas desgraças, estes acidentes, estes crimes; também foste a causa deles, foi por tua culpa que alguns seres sofreram», bem podereis protestar, dizendo que nunca fizestes todo aquele mal, que vos responderão: «Sim, mas participaste nele e essas pessoas sofreram realmente por tua causa: os teus pensamentos e os teus sentimentos contribuíram para que outros lhes fizessem esse mal.»

Não somos responsáveis apenas pelos nossos atos, mas também pelos nossos pensamentos e sentimentos, porque eles agem como forças no mundo invisível que arrastam os seres para o mal ou para o bem.

A atitude correta...

  O espiritualista deve encontrar um justo equilíbrio entre o orgulho e a humildade exagerada. Não é bom que, com o pretexto de ser modesto, ele se apague completamente, porque acabará por ficar embrutecido e estúpido. Mas sentir-se um ser superior, alegando que segue um ensinamento espiritual num mundo de materialistas e de descrentes, também não é recomendável, porque desse modo ele tornar-se-á ridículo. O que é mais difícil é a medida correta. Muito poucos discípulos, mesmo nas Escolas Iniciáticas do passado, souberam não soçobrar no orgulho ou numa humildade afetada… que, muitas vezes, não é senão outra forma de orgulho!

Então, como se apresenta um verdadeiro espiritualista, um verdadeiro discípulo? Sempre natural, simples, acessível. Para que há de ele querer atrair atenções por meio de ares superiores ou inspirados? Vós perguntareis: «Mas então não devemos querer mostrar as nossas aquisições espirituais?» Na realidade, não há absolutamente nada a mostrar! Se soubestes adquirir verdadeiras riquezas espirituais, elas aparecerão por si, não precisais de as expor. Uma vez que trabalhais sobre vós, deixai que os traços do vosso rosto, a vossa postura, os vossos gestos, falem por vós. Sede simples, espontâneos, naturais. Para que haveis de impor-vos de uma maneira artificial? Quem segue um ensinamento espiritual deve compreender que terá ocasião de manifestar as suas qualidades e que os outros as notarão sem que ele tenha necessidade de adotar toda a espécie de atitudes para as evidenciar. Ele que deixe falar o seu trabalho interior: mesmo à sua revelia, esse trabalho dará testemunho dele.

Quando alguém se põe a falar-vos insistentemente acerca do trabalho espiritual que está a fazer, desconfiai! Vangloriar-se do seu trabalho espiritual não é próprio de um verdadeiro espiritualista. Por isso, aconselho-vos a não falar nem do trabalho que empreendestes, nem dos resultados a que aspirais. Aliás, mantendo secreto o vosso trabalho mantereis o impulso, o ardor, o entusiasmo de que necessitais para progredir.

Imaginai um jardineiro que acaba de plantar a semente de uma árvore extraordinária, única. Se ele for insensato ao ponto de ir desenterrá-la sempre que alguém vier visitá-lo e dizer: «Está a ver esta semente? Olhe bem para ela! Um dia, ela tornar-se-á uma árvore excecional com frutos deliciosos; qualquer dia já se poderá comê-los…», para logo correr a plantá-la de novo, será o fim da pobre árvore. Mas é isso que muitas pessoas têm tendência para fazer: desenterram o que mal acabaram de plantar, para que toda a gente saiba bem que árvore elas estão a fazer crescer. Pois sim, mas mataram-na! Não deviam ter tirado a semente do solo.

Por isso, limitai-vos a trabalhar! As leis são verídicas, absolutamente verídicas: se o que fazeis é belo, podeis estar certos de que, mais dia menos dia, isso transparecerá e todos serão obrigados a sentir as bênçãos que emanarão de vós.

Só se influencia os outros pelo exemplo...

  Mal descobrem algumas verdades da Ciência Iniciática, muitas pessoas querem imediatamente instruir as outras e começam a pregar a torto e a direito e a tentar convencê-las. E, se não o conseguem, criticam-nas e consideram-nas com desprezo. Pois bem, elas vão demasiado depressa, ainda não aprenderam uma regra essencial da Ciência Iniciática, segundo a qual o discípulo deve começar por viver uma verdade antes de querer convencer os outros acerca dela. E vivê-la significa experimentá-la por muito tempo, fazer exercícios com ela, ao ponto de ela se tornar carne e osso nele, ser um com ele. Quem quer começar imediatamente a convencer os outros das verdades espirituais não só não consegue, como até se arrisca a perdê-las.

Sim, deveis guardar essas verdades convosco durante algum tempo sem dizer nada, viver com elas, fazê-las vossas, para que elas vos tragam forças e vos ajudem a triunfar nas provações que tereis de atravessar; então, não só elas já não vos abandonarão, como, quando as transmitirdes aos outros, devido à vossa tónica de sinceridade elas terão uma grande força de persuasão.

Mas também neste domínio há imensas coisas a conhecer antes de se procurar transformar os outros, porque, se eles mesmos não sentirem essa necessidade, se eles não tiverem compreendido a importância de uma filosofia e de uma disciplina espirituais, não haverá nada a fazer senão deixá-los. A sua atitude prova apenas que eles ainda são muito jovens e têm necessidade de experiências, de lições. Sofrerão, claro, e esse sofrimento abrigá-los-á, um dia, a mudar de vida. Mas, entretanto, deixai-os tranquilos. Aliás, deixai toda a gente tranquila; ocupai-vos apenas de vós próprios, procurando melhorar-vos. Só o vosso exemplo mostrará aos outros que estão enganados ou que estão a agir mal. Sim, o vosso exemplo. É trabalhando sobre vós próprios que trabalhais sobre os outros: eles apercebem-se de que possuís qualidades que eles não possuem e, como também desejam possuí-las, são levados a imitar-vos e a aperfeiçoar-se.

Parai, pois, de vos ocupar dos outros para fazer notar as suas insuficiências e fraquezas, porque desse modo não só não lhes proporcionais nada de bom, como também vos tornais pessoas sem brilho e desagradáveis como eles. Aceitai-os como são, sede pacientes e trabalhai noite e dia para vos aperfeiçoardes, até lhes mostrardes que há algo de magnífico a adquirir. Enquanto eles não souberem isso, não será por palavras que os ensinareis. Como podereis pensar em convencer as pessoas a libertarem-se de fraquezas de que vós próprios nem sempre vos libertastes? Como pode um medroso transmitir audácia aos outros? Se ele gritar «Avante!» com as pernas a tremer, como irá arrastar multidões? Ficai sabendo que só a vitória sobre as vossas fraquezas vos dará poderes, e esses poderes, mais tarde ou mais cedo, transparecerão através dos vossos olhos, dos vossos gestos, do vosso rosto, da vossa voz; eles transparecerão, ainda que queirais escondê-los. Não penseis que é fácil alguém imiscuir-se nas fraquezas dos humanos; são precisos anos e anos de trabalho sobre si próprio antes de se estar apto a fazê-lo.

Receber e dar...

  Ao nascerdes, recebeis dos vossos pais um corpo – alguns dizem: a vida. E depois, durante anos e anos, sois alimentados, vestidos, alojados e educados por eles. É uma imensa dívida que se acumula. Muitos recusam reconhecê-la: criticam os pais, opõem-se a eles, pensam que não lhes devem nada. Pois bem, isso é desonesto. Mesmo que não sejam perfeitos, os vossos pais amaram-vos, inquietaram-se por vós, cuidaram de vós quando estivestes doentes. Isso tudo não significa nada? Ficai a saber, pois, que tendes, antes de tudo, uma dívida para com os vossos pais.

Depois, tendes uma dívida em relação à nação a que pertenceis, porque recebestes dela toda uma herança de cultura e de civilização, com bibliotecas, laboratórios, universidades, teatros… Ela põe à vossa disposição as suas estradas e vias férreas, os seus navios e aviões, o seu exército e a sua polícia para vos proteger. Depois, deveis alguma coisa à vossa raça, porque ela vos deu um tipo físico com uma cor de pele, de cabelo, etc., uma estrutura psíquica, uma mentalidade.

E não é tudo; também contraístes dívidas para com o planeta, esta terra generosa que vos alimenta e vos dá sustento… e também para com todo o sistema solar, porque é graças ao sol e aos planetas que somos incessantemente sustentados, vivificados… para com todo o Universo… e, por fim, para com o Senhor…

Quer queiramos, quer não, não fazemos outra coisa senão receber, receber, receber, e agora temos uma enorme dívida. Aquele que quer comportar-se como um ser justo deve estar consciente desta dívida. Por isso, ama, antes de tudo, os seus pais, é bom para eles, para lhes retribuir o que lhes deve. Pela sua atividade, pelos seus pensamentos e sentimentos, ele também se esforça por retribuir algo à sociedade, à nação, à humanidade inteira, ao sistema solar, a todo o cosmos, e, finalmente, a Deus. É desta maneira que ele salda as suas dívidas e então a natureza reconhece-o como um ser inteligente. Todos os que não procedem assim, ela considera-os como ladrões, seres desonestos, e envia-lhes alguns corretivos para os instruir e os fazer ganhar juízo.

E por tudo o que recebemos da natureza – ar, água, calor, luz… – nós contraímos mais uma dívida. Mas, como não podemos retribuir esses benefícios sob a forma em que os recebemos, nem desobrigar-nos com dinheiro, temos de pagar a dívida com o nosso amor, o nosso reconhecimento, o nosso respeito, a nossa vontade de estudar tudo o que a Inteligência Cósmica escreveu no grande livro da natureza. E, de resto, também nos desobrigamos fazendo bem a todas as criaturas, dando-lhes da nossa luz e do nosso calor, sob a forma de pensamentos justos e retos e de sentimentos generosos.

Lá porque não podemos devolver o que recebemos sob a forma em que o recebemos, não devemos pensar que não estamos em dívida. Recebemos o nosso corpo da terra e devolver-lho-emos um dia, necessariamente; mas, entretanto, enquanto estamos vivos, conservamos o nosso corpo, ninguém nos pede para o darmos. O que podemos dar são as nossas vibrações, as nossas emanações luminosas. O homem foi criado nas oficinas do Senhor para irradiar através do universo inteiro. Ele recebeu uma quinta-essência de luz que, incessantemente, pode ampliar, vivificar e enviar para o espaço.

Eis ideias novas para vós! No plano físico, nós somos limitados, mas no plano espiritual as nossas possibilidades são infinitas e podemos retribuir multiplicado por cem tudo o que nos foi dado.

Uma justiça superior...

  Alguém vos desiludiu ou vos lesou e então contais a toda a gente o que vos fizeram. Dir-me-eis: «Isso é normal, é para repor a justiça!» Não. Essa noção de justiça está na origem de todos os infortúnios. Deixai a justiça tranquila. «Mas, então, o que havemos de fazer?» Recorrei a um princípio superior à justiça, um princípio de amor, de bondade, de generosidade.

Há dois mil anos que Jesus trouxe este novo ensinamento, mas os cristãos continuam a aplicar a lei de talião – olho por olho, dente por dente – e ainda não compreenderam que, para se ser verdadeiramente grande, verdadeiramente livre, é preciso ultrapassar a noção de justiça. Como? Vós fizestes, suponhamos, algum bem a alguém; por exemplo, destes-lhe dinheiro. Depois, um dia, achais que essa pessoa agiu mal para convosco e relatais a toda gente o que fizestes, queixando-vos de que ela não esteve à altura da vossa generosidade e da vossa confiança. Por que haveis de ir relatar tudo isso? Se falais a todos sobre o bem que fizestes e, ainda por cima, lamentais tê-lo feito, estais a demolir esse bem… Estava inscrito nos registos celestes que deveríeis ser recompensados, mas agora, agindo como agis, apagais a vossa boa ação.

Ainda que alguém vos engane ou vos lese, não deveis propalar isso, nem, sobretudo, procurar exercer represálias. Pelo contrário, pelo vosso comportamento deveis dar a essa pessoa um exemplo da maneira correta de se comportar. Um dia, ela sentirá vergonha e fará tudo para reparar as suas injustiças para convosco. É preciso fechar um pouco os olhos e perdoar; é assim que cresceis.

Compreendei, doravante, quão proveitoso é receber a luz da Iniciação. Um homem comum que tenha sido ofendido, lesado, vai, evidentemente, ripostar, para dar, segundo ele, uma lição ao seu adversário, e todos acharão que isso é normal, que é “justo”. Sim, talvez seja justo segundo os conceitos que o mundo vulgar tem da justiça, mas é estúpido aos olhos do mundo divino. Porque o que se passa é o seguinte: a partir do momento em que ele se deixa levar pelos instintos, pelo desejo de vingança, entra num círculo infernal do qual já não conseguirá sair. Desembaraçou-se de um inimigo, é certo, mas aparecerão sempre outros – é a vida! – e ele terá de se esforçar de novo para os eliminar. Desta maneira, manterá em si próprio sentimentos e atitudes que apenas reforçarão a sua natureza inferior. Mais: as suas vitórias, tão dificilmente alcançadas, não durarão muito tempo, porque os seus inimigos voltarão a encontrá-lo numa próxima incarnação e terão todas as possibilidades de se desforrar. Por conseguinte, como vedes, essa velha compreensão da justiça não traz qualquer solução; pelo contrário, ela complica as coisas, torna a existência pesada, aumenta as dívidas cármicas e, finalmente, conduz a derrotas.

O verdadeiro espiritualista, que conhece as leis, aplica outros métodos: deixa os adversários tranquilos, entregues ao seu próprio processo de desenvolvimento! Ele sabe antecipadamente como eles vão acabar, se continuarem. Quanto a ele, começa um trabalho gigantesco sobre si próprio, ora, medita, aprende, exercita-se, e pouco a pouco começa a possuir a verdadeira sabedoria, os verdadeiros poderes.

Evidentemente, é preciso terdes muito amor, muita bondade, muita paciência e muita luz para renunciardes a empregar as mesmas armas que usaram os que vos fizeram mal. Mas este método que vos dou é o mais eficaz. Deixais os vossos inimigos sossegados, não vos ocupais mais deles, ocupais-vos unicamente do vosso aperfeiçoamento. Quando eles virem isso, sentir-se-ão tão feios, macilentos e estúpidos ao vosso lado, que, mais tarde ou mais cedo, se arrependerão e virão reparar o mal que vos fizeram.

É que existe mesmo uma lei da natureza segundo a qual, um dia – e, se não for nesta incarnação, será na próxima – todos os que vos enganaram, lesaram, feriram ou traíram serão obrigados a vir procurar-vos para repararem as suas faltas. Pode acontecer que, sentindo intuitivamente que eles são antigos inimigos, queirais afastá-los. Não importa; eles continuarão a procurar-vos e a pedir-vos que aceiteis os seus serviços. Porque a lei é assim. E já aconteceu com muitos. Portanto, todas as pessoas que vos fizeram mal e a quem respondestes com o perdão serão obrigadas pela lei cósmica (quer elas queiram, quer não; a sua opinião não conta) a vir reparar as injustiças que vos fizeram.

Eu não quero dizer que deveis deixar-vos aniquilar pelos maus, não; deveis ripostar, mas encontrando uma resposta tal, que produza no coração e na alma dos vossos adversários uma enorme reviravolta que seja benéfica para vós e para eles. Esta atitude é duplamente vantajosa.

 

Como pode alguém ajudar o seu país...

Os dirigentes de um país estão continuamente expostos a críticas, à hostilidade ou à troça dos cidadãos. E por toda a parte, para divertir o público, nos bares, nos teatros, na rádio, na televisão, são feitas referências aos homens políticos em moldes ridículos e grotescos. Mesmo que, por vezes, haja razão para criticar e troçar, não será desta maneira que se irá levá-los a melhorar. Pelo contrário, atormentando-os com pensamentos e sentimentos negativos não só não se consegue nada, como ainda se cria no invisível as condições favoráveis para que eles cometam ainda mais erros e tomem decisões cada vez menos luminosas para o país. Sim! Como vedes, esta questão leva-nos muito longe.

Assim, se quereis verdadeiramente ajudar o vosso país, em vez de praguejardes constantemente contra aquele que está à sua cabeça, enviai-lhe luz, a fim de que ele seja inspirado. Não podeis ajudar o vosso país todo porque ele é imenso, mas basta que ajudeis um homem, um só; é mais fácil, e ele fará bem a todos porque muitas coisas dependem de si. Se ele conseguir fazer aprovar leis sociais a favor da saúde pública, da habitação, da instrução, etc., todos beneficiarão, porque um só foi bem inspirado.

Os cidadãos de um país devem tomar consciência, finalmente, das ligações que existem entre eles e os seus dirigentes. Não basta exigir isto e reclamar aquilo, é preciso aprender a conhecer os métodos mais eficazes para se obter o que se deseja, sem desencadear consequências ainda piores.

Vós sabeis que a sabedoria dos povos se exprime frequentemente por contos. Há um que narra a história de um reino onde só aconteciam epidemias, fomes, tumultos. O rei, não sabendo o que fazer para remediar todas aquelas desgraças, mandou vir um sábio, e este disse­‑lhe: «Majestade, és tu a causa de todas as desgraças do teu reino. Vives na devassidão, és injusto, cruel, e por isso as catástrofes não param de cair sobre o teu povo.» Em seguida, o sábio apresentou-se diante do povo e disse-lhe: «Se sofreis, é porque o merecestes; pela vossa maneira insensata de viver, atraístes um monarca que causa a vossa infelicidade.» Eis como os sábios explicam as coisas. Quando os cidadãos de um país decidem viver na luz do espírito, o Céu envia-lhes governantes nobres e honestos que só trazem bênçãos; mas, se uma nação tem dirigentes que dão livre curso aos seus piores caprichos a expensas do povo, bem, aí é preciso que o povo tome consciência de que tem uma parte da responsabilidade.

E depois, por que se há de querer sempre que as soluções venham dos outros, por mais altamente colocados que eles estejam? Por que se há de esperar que sejam sempre os outros a começar a trabalhar para melhorar a situação? Na vossa opinião, são sempre os outros que devem fazer esse esforço; mas por que haveriam eles de o fazer? Eles agem como vós, esperam que sejais vós a esforçar-vos primeiro, e isso pode durar eternamente. Então, decidi-vos vós, finalmente, a agir. Alguns perguntar-me-ão: «Mas o que é que está a aconselhar-nos? Quer que façamos uma carreira política?» Para mim, a questão não reside nisso. Quando eu falo de trabalho útil para a sociedade, subentendo em primeiro lugar um trabalho interior que cada um deve fazer sobre si próprio e que é sempre indispensável, quer a pessoa se lance, quer não, numa carreira política.

A única atividade realmente importante na vida é tornarmo-nos mais lúcidos, mais generosos, menos interesseiros, mais senhores de nós próprios. Direis vós: «Sim, mas, se seguirmos esses conselhos, se fizermos esse esforço para nos aperfeiçoarmos e nos reforçarmos, as condições no mundo são tais que ficaremos a um canto, ignorados, obscuros, privados de todos os meios de ação.» Que sabeis vós a esse respeito? Se vos tornardes verdadeiramente capazes de manifestar as virtudes do espírito, mesmo que não conteis com isso, os outros recorrerão a vós como conselheiros, como guias. Se isso ainda não aconteceu é porque não o mereceis, é porque ainda não estais preparados para tal.

É preciso aprender a contar com os poderes do espírito; é nisso que se vê o verdadeiro espiritualista. Quando se trata só de falar, muitas pessoas poderão dizer-se espiritualistas, farão discursos intermináveis sobre a reincarnação, a aura, as hierarquias dos anjos, mas não será isso que as ajudará a resolver os problemas da sociedade. Só se poderá resolver os problemas da sociedade se se fizer continuamente um esforço para despertar em si os poderes da vontade, do bem e da luz.

Ninguém se salva sozinho...

A maior preocupação dos humanos é adquirirem o que precisam para si e para a sua família. De vez em quando, pensam um pouco nos outros, mas é raro. Por isso, a sorte da humanidade não melhora: os humanos são egoístas, não pensam na coletividade. Creem que basta resolverem as suas próprias questões para viverem em segurança. Ora, isto não é verdade.

Quer estejam conscientes disso, quer não, os humanos pertencem a uma coletividade e, se nessa coletividade ocorrem perturbações ou desastres, o seu bem-estar individual não está garantido. Por conseguinte, mesmo que dediquem todo o tempo a tratar das suas questões, na realidade estas nunca ficarão definitivamente resolvidas. Há sempre uns inconvenientes que podem surgir da parte da coletividade, e lá vem a ruína. Aliás, a História tem mostrado isso mesmo. Têm existido pessoas tão ricas e poderosas que, aparentemente, nada poderia atingi-las, mas ocorreram problemas na coletividade e elas acabaram por perder tudo, até a vida. Só a melhoria da vida coletiva pode pôr cada indivíduo em segurança e ao abrigo das necessidades. Por isso, compete a cada um substituir o seu ponto de vista limitado e egocêntrico por um ponto de vista mais vasto, mais universal: ele ganhará com isso, não apenas no plano material, mas também, e sobretudo, no plano da consciência.

A consciência desperta verdadeiramente no homem quando ele manifesta sensibilidade às noções de coletividade, de universalidade. Esta faculdade permite-lhe sentir que os outros são um prolongamento de si próprio. Aparentemente, é certo, cada ser está isolado, separado dos outros, mas, na realidade, há uma parte espiritual dele mesmo que entra na coletividade, que vive em todas as criaturas, em todo o cosmos. No momento em que essa consciência espiritual é despertada em cada um, ele sente tudo o que acontece de bom ou de mau aos outros como se fosse a si próprio e esforça-se por só lhes fazer bem, porque é a si que estará fazendo esse bem.

Até agora, todos os ensinamentos espirituais têm arrastado os humanos, mais ou menos, para a via da salvação individual. O saber, os poderes, a iluminação, tudo o que alguém conseguia adquirir, era só para si. Por isso, muitos iam isolar-se nas montanhas, nas grutas ou nos mosteiros, para não serem incomodados. Esta filosofia está agora ultrapassada. Deve-se procurar a perfeição, é certo, mas não o isolamento, físico ou espiritual, para não ser incomodado pelos outros. Pelo contrário, deve-se aceitar os inconvenientes, fazer sacrifícios, sofrer, até, mas ser útil.

Assim, se frequentais uma Escola Iniciática para vos ocupardes unicamente da vossa própria evolução espiritual, isso prova que o vosso ideal ainda não é muito elevado. «Mas nós queremos salvar a nossa alma» – dirão alguns. Sim, salvar a sua alma é o que as religiões têm ensinado ao longo de séculos. Pois bem, isso não é muito glorioso, já não é tempo de estar preocupado em salvar a sua alma. O que imaginam as pessoas acerca da sua alma? Que valor, que importância tem ela, a “sua alma”, face à multidão de criaturas e à imensidão da criação? É tempo de as pessoas pararem de se ocupar de si próprias e de pensarem também na alma dos outros; só então elas serão salvas! Senão, enquanto se ocupam da salvação da sua alma, isolam-se do resto do mundo. Mais ninguém conta: elas só pensam na sua alma! Mas isto não tem qualquer sentido e nem sequer é belo. Há que abandonar esta atitude.

Os espiritualistas devem renunciar a procurar apenas o seu bem ou a sua salvação pessoal e meter na cabeça o ideal da perfeição, compreendendo que essa perfeição não deve ser apenas para eles. Aperfeiçoar-se só para si próprio representa para um ser apenas cinquenta por cento da sua tarefa. A nossa verdadeira tarefa é aperfeiçoarmo-nos para nós mesmos e para os outros, a fim de sermos úteis ao mundo inteiro.

Como pode alguém ajudar o seu país...